quinta-feira, 21 de julho de 2011

Andarilha Fantasma - Mariana Machado


O céu ia escurecendo com o passar dos minutos. Seu brilho ia se perdendo na imensidão da noite. E a escuridão começava a reinar, única, numa terra de tantos.
Caminhava sem olhar para onde ia, sem notar os prédios, as ruas, os carros. Invés de rostos, enxergava borrões.
Programada para lugar nenhum, porém seus passos eram firmes, dolorosos, quase poéticos. Vagava, era verdade, mas não estava perdida.
E então uma luz forte roubou-lhe totalmente a sua atenção. Ele reluzia, cada uma das suas células brilhavam e em meio a tanta escuridão ele chamara a atenção da garota como nunca antes alguém havia chamado.
Ele passou por ela e continuou seu caminho, assim como ela o fez. Eram errantes e por isso não havia tempo para encontros e desencontros. Mas aquele brilho permaneceu em sua cabeça, instigando sua memória.
Ela cuidara de todos, por tantos anos, ajudara, resolvera, se apegara e quem havia cuidado dela? Era como se ela não existisse agora que não precisavam mais dela. Seu nome nada valia, seu ser muito menos.
Continuava andando como se só pudesse fazer isso. Como se não tivesse para onde voltar e nem onde ir.
Agora começava a notar onde estava, passava a mão pelas paredes ásperas, sentia o vento forte cortar-lhe a face, escutava os ruídos urbanos e seguia, sempre em frente e sozinha, como fizera sua vida inteira.
Seguia em ruas vazias e mal iluminadas e ia se perdendo dentro de si mesma.
Quando aquela incumbência acabaria? Quando descansaria? Quando arranjaria alguém que a amasse?
Achava que sabia muito bem a resposta e isso lhe doía a alma.
Acelerou seu passo, pois o breu era total e aquilo já estava se tornando perigoso, afinal sabe-se lá que sombras se escondem na escuridão. Quis mudar de lado, se preparava para atravessar a rua, quando o carro lhe atingiu.
Era tão frágil e a batida havia sido tão forte que o acidente acabara sendo fatal. Um motorista embriagado que sequer socorrera sua vitima. Um assassino frio e sem piedade.
O corpo achado na manhã seguinte foi levado para o órgão de competência. Na parte da tarde seu rosto já estava estampado em todos os jornais e tele-jornais daquela cidade inquieta. Um ser brilhante recortou seu rosto do jornal e levou consigo na carteira, para nunca esquecer o encontro que durara algumas frações de segundos e o levara a conhecer o amor.
Ninguém foi buscar o corpo. Ninguém deu por sua falta. Era como se ela sequer existisse. Era como se não tivesse entrado na vida de ninguém.
Foi enterrada como indigente no cemitério da cidade. E até hoje espera que alguém se de conta que ela existiu e morreu.

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