segunda-feira, 10 de janeiro de 2011
Amargura - Mariana Machado
Quando ela o levou pra lá, eles já não tinham mais um caso. Porém era evidente sua vontade.
Hoje eu vejo que ela nos pôs em contato com ele naquela tarde, por que sabia que assim não trairia meu pai, pela última vez.
Ela estava traindo a nós ao levá-lo e também ao ir. Mas estaria traindo a si própria se ficasse.
E naquele mesmo dia, depois da chegada do meu pai e de uma longa discussão, ela se foi junto do amante. E pela própria felicidade nos jogou em um mar de amargura.
O declínio do meu pai começou naquela noite, com uma garrafa de whisky como companheira, já que a sua esposa, já que a mulher da sua vida, o havia deixado e também deixado as duas filhas, pra fugir com o amante.
A partir dai tudo foi de mal a pior. Meu pai já não fazia mais a barba, suas roupas, por mais que estivessem limpas, pareciam sujas. E por mais que ele dormisse, nunca estava descansado. Era como se ele carregasse todo o peso do mundo, e isso o deixava exausto.
Minha avó materna veio morar conosco. Ela desaprovava a ida da minha mãe. Desaprovava aquele homem. E principalmente, sempre aprovara meu pai. Por mais zelo e amor que minha avó tivesse conosco e com meu pai, nem ele e nem nós, conseguíamos curar a ferida da partida de minha mãe.
Foi tão estranho quando finalmente pude vê-la de novo. Ela estava com ele e reluzia. Quando estava conosco e com meu pai nunca havia sido tão feliz assim. E pela primeira vez, desde que ele entrou em nossas vidas eu não o odiei. Não o odiei por fazer minha mãe feliz.
Mas o medo, medo de que ele fizesse o mesmo que fez com minha madrinha, isso eu nunca perderia.
Quando a reencontrei de novo, já haviam passado três anos de sua partida repentina. Havia passado três longos anos sem ver minha mãe, e por mais que eu a amasse acima de tudo, ela já não tinha mais nenhum valor representativo pra mim.
A respeitava por que sabia que o que a levara a cometer tais atos era amor, um amor que nos braços do meu pai, um homem bom, ela nunca conseguiu desenvolver. E que nos braços de um cafajeste, brotou em abundancia.
No dia que a reencontrei, estava com meu namorado, que se diga de passagem foi um namoro conturbado, depois um noivado conturbado e um casamento maravilhoso.
Por causa do casamento dos meus pais sempre tive medo de que meu namoro e mais tarde, meu casamento, não desse certo. Meu marido era um homem bom, da estirpe do meu pai, e eu tinha medo de ser estragada como minha mãe. Medo de ser incapaz de amá-lo, largando-o por um sem vergonha e despedaçando seu coração.
Mas como vim perceber com o passar dos anos, tal como meu marido, eu também era da estirpe do meu pai.
O homem que minha mãe se envolveu já tinha um histórico estragado na nossa família. Havia se envolvido com a minha madrinha e depois de quatro longos anos, de prováveis encenações, ele partiu e levou a alma dela junto.
Muito tempo depois, minha mãe se encontrou com ele. Sentia ódio, sentia raiva. Queria vingança, queria fazê-lo pagar pela dor que ele havia causado. E como diz o ditado, amor e ódio, andam lado a lado. Não sei como, só sei que daquele encontro, vieram outros, e ela se apaixonou.
Até que um dia, ela não conseguiu mais suportar a vida insossa que tinha e nos largou sem derramar nenhuma lagrima, e foi ser feliz.
Depois do reencontro com a minha mãe, só a vi mais uma vez. E foi em seu enterro.
Ele não compareceu. Como não compareceu em muitos momentos da vida dela. Ele era um cafajeste e sempre seria. Depois de cincos anos de ilusão com ela, ele partiu. Da mesma forma que havia feito com a minha madrinha. Era doloroso saber que todo o sacrifício que ela havia feito foi em vão a. E mais doloroso inda saber que toda a amargura que havíamos passado por causa dela fora em vão também.
Mas quando ele a deixou e partiu, não podíamos recebê-la de volta, ela estava estragada, e de certa forma, nós também. Ela havia nos deixado em tal estado que tê-la de novo já não faria mais diferença. E como havíamos feito desde sua partida, vivemos separados, por uma linha de dor e decepção.
Uma ultima prece, foi tudo que nos uniu por uma ultima vez e depois nos separou eternamente.
E com isso então eu expurguei todos os meus demônios e fui viver a vida que minha mãe foi incapaz de viver, estando feliz.
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